24 agosto 2025 - 03:59
Quando o bombardeio não derrota a resistência

Em meio a uma ofensiva sem precedentes da ocupação israelense, Gaza revive cenas que remetem à destruição de Dresden na Segunda Guerra Mundial. Sob cerco e bombardeio, a cidade enfrenta um capítulo de genocídio que vai além de uma operação militar, configurando-se como parte de um projeto colonial para apagar a identidade palestina.

Por Wisam Zoghbour, para AhlulBayt News Agency- Abna, desde Gaza

Em uma cena que remete à lembrança da destruição total infligida pelos aliados à cidade alemã de Dresden durante a Segunda Guerra Mundial, a ocupação israelense ameaça hoje apagar Gaza por completo. Essa pequena cidade, que há anos sofre sob um cerco sufocante, encontra-se agora diante de um novo capítulo de genocídio, conduzido por um governo fascista liderado por Benjamin Netanyahu, que começou, na prática, a executar um perigoso projeto colonial: destruir Gaza e deslocar seu povo.

A Nakba contínua: do deslocamento à fome

Há alguns dias, o exército de ocupação passou a empurrar mais de um milhão de habitantes de Gaza para o sul e o centro, onde imperam a superlotação e a miséria, onde não há remédio, abrigo nem alimento. É um deslocamento forçado sob bombardeio, um emparedamento de civis em espaços estreitos, transformados pela força das armas em prisões a céu aberto, onde as pessoas morrem de fome e de doença.

Enquanto se fala em negociações indiretas para um cessar-fogo e para a entrada de ajuda humanitária, a máquina de guerra israelense continua destruindo todos os elementos de sustentação da vida. A fome deixou de ser ameaça: tornou-se realidade diária. Pessoas morrem em silêncio, e Gaza é deixada para ser exterminada diante dos olhos do mundo.

Um projeto colonial que vai além de Gaza

temporária. É a execução aberta de um plano colonial de substituição populacional, que visa arrancar os palestinos de sua terra e redesenhar o mapa demográfico e político da Palestina ocupada. Gaza está sendo demolida, a Cisjordânia é retalhada por assentamentos, e os habitantes de Jerusalém são expulsos de suas casas sob a bandeira da “judaização”. O que ocorre em todas essas frentes faz parte de um único projeto expansionista sionista, que busca esvaziar a terra de seu povo e esmagar tudo o que represente a identidade nacional palestina. Se Gaza hoje é o palco mais incandescente, a Cisjordânia também se desfaz sob o peso da colonização, e Jerusalém é roubada de sua história e identidade, dia após dia.

O mundo silencia... e a Casa Branca abençoa

Apesar de milhões de manifestantes nas principais capitais do mundo, apesar de declarações de parlamentos e governos, Netanyahu mantém-se seguro graças ao apoio incondicional da administração norte-americana. Washington não escondeu sua posição, ao contrário, declarou-a de forma clara: “Israel tem o direito de fazer o que quiser em defesa de sua segurança.” Mas que segurança é essa que se ergue sobre os corpos de crianças, sobre as ruínas de hospitais e sobre a fome dos cercados? O silêncio internacional, a cumplicidade política e a duplicidade de critérios são elementos que encorajam a ocupação a prosseguir em seus crimes, na convicção de que não há preço a pagar nem punição à vista.

Gaza não é apenas geografia... é uma ideia

O que a ocupação não compreende é que Gaza não é apenas uma cidade no mapa. Gaza, como Dresden, pode ser bombardeada e destruída, mas seu espírito não é derrotado. Não se trata apenas de blocos de concreto e campos de refugiados; é uma ideia, uma identidade, um significado de dignidade e de resistência. Ao longo de décadas, Gaza nunca deixou de confrontar a ocupação, de acolher a resistência e de oferecer sacrifícios, até se tornar um símbolo mundial de firmeza e desafio.

No bairro de Zeitoun, um dos maiores de Gaza, o exército de ocupação iniciou o novo capítulo de seus crimes, mas em cada casa demolida nasce uma nova determinação, e em cada mártir se enraíza a convicção de que o direito não é destruído pelo bombardeio.

A resistência é responsabilidade de todos

O povo palestino não está sozinho. É verdade que sofre sozinho os bombardeios e a fome, mas resiste em nome de toda uma nação. Sua resistência hoje não é mero reflexo, mas um ato nacional autêntico, que defende a terra, a dignidade e o direito de existir.

As facções da resistência, a Frente Democrática e outras forças nacionais reafirmaram que esse povo, que resistiu por anos e surpreendeu o mundo com sua paciência, continuará o confronto até que o inimigo pague o preço de sua agressão e fracasse em seu projeto expansionista. Aqui, recai a responsabilidade sobre todos os que se dizem defensores da liberdade e da justiça — árabes, pessoas livres e a consciência mundial.

Gaza não é bombardeada... é eternizada

Gaza pode ser bombardeada, como Dresden foi. Seus bairros podem ser destruídos e seus escombros soterrados. Mas, assim como Dresden retornou para testemunhar os horrores da guerra, Gaza permanecerá — apesar da dor — viva na memória, no presente e no futuro de um povo que não aceitará nada menos que a liberdade.

As ameaças não abalarão Gaza, porque quem escolheu resistir não é bombardeado... é eternizado.


Edição de Texto: Alexandre Rocha

Wisam Zoghbour é jornalista, membro da Secretaria-Geral do Sindicato dos Jornalistas Palestinos  e diretor da Rádio Voz da Pátria

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